terça-feira, 8 de junho de 2010

Solilóquios espirituais

Resisto, inquieto com a necessidade de esvaziar-me. Não tolero ver a vida se arrastando, o cenário mudando e eu sem fôlego, a correr sem me perceber.

Os pontapés da vida desnudaram a verdade de que os processos de esvaziamento são doloridos. Processos que significaram perder a onipotência que veio a reboque da minha religião e que herdei de minha insegurança juvenil. Há mortes que não estou disposto a morrer, há privações que procuro dispersar, há dores que não quero experimentar.

Quero ter o controle do tempo inclemente. Não suporto ouvir que sou responsável por quem sequer conheço. Não me imagino preso a compromissos alheios. Careço de ócio criativo, sou natural dos sábados. Anseio por conversas calmas, nasci de um amor calado. Debulho os instantes para sonhar com a eternidade. Choro a dor do mundo porque sei de meu egoísmo.

Fotografo o orgulho que se disfarça e sutilmente se esconde em meu coração. Tenho uma empáfia que se traveste de piedade e habilmente me faz sentir puro. Há uma arrogância embutida em mim, que me espreita de soslaio e, transparente, infecta tudo o que faço. Continuo dono de rompantes rebeldes, já enraizados na medula dos ossos.

Sei que devo aprender a ser apenas gente. Grito para dentro, meu grito é mudo: "Ainda hei de seguir a senda despretensiosa dos santos".


Ricardo Gondim

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